Criptomoedas são iguais a qualquer outro ativo em pelo menos um aspecto: você não pode levá-las após a morte. Mas se suas chaves privadas o acompanharem até o túmulo, não será possível nem deixar suas criptos como herança. Na verdade, cerca de US$ 140 bilhões em Bitcoin – cerca de um quinto da oferta total – podem estar perdidos para sempre, de acordo com a empresa de análise Chainalysis, e planejamentos sucessórios malfeitos podem estar na raiz do problema.
“Realmente não há como recuperá-los – em cripto não existe o botão ‘esqueci a senha’”, disse Nick Neuman, cofundador e CEO da fornecedora de carteiras de criptomoedas Casa, à Fortune.
No sistema financeiro tradicional, dinheiro deixado por uma pessoa morta pode ser recuperado por meio de bancos ou gestoras de ativos, mas a herança em criptomoedas é mais complexa devido a questões de custódia. Ao contrário das moedas fiduciárias, os criptoativos (incluindo os famosos NFTs) podem ser armazenados em vários locais: de carteiras “frias” de hardware, desconectadas da internet, a carteiras “quentes” online, ou em exchanges como Coinbase ou Binance.
Num momento em que pesquisas sugerem que muitas pessoas estão comprando criptomoedas para deixar para os filhos, como é possível deixar ativos digitais para a próxima geração?
Comece tendo iniciativa
Os herdeiros de criptomoedas deixadas de herança, assim como acontece com dinheiro ou imóveis, devem ser indicados em testamento, e se você deseja nomear um inventariante para acessar as chaves privadas, mas não herdar os bens, isso também deve ser declarado.
No entanto, a situação fica mais delicada se a intenção for atribuir ao seu advogado a função de administrador, pois a questão ainda é uma lacuna jurídica no mundo, disse o advogado de ativos digitais Max Dilendorf à Fortune. “É impossível”, diz ele, afirmando que os reguladores ainda não abordaram essa questão. “É uma lacuna enorme”, falou (no Brasil, que também ainda não regulamentou a herança em criptoativos, advogados aconselham o recolhimento de ITCMD).
Mantenha registros seguros – e compartilhe o que puder
Se suas criptomoedas estiverem armazenadas em uma carteira, ensine sua família sobre o que é e como funciona. Essas instruções podem ser formalmente escritas em seu testamento ou compartilhadas com seu advogado.
No entanto, observa Park, se suas criptomoedas estiverem em uma exchange, “não há muita coisa específica sobre o que você precisa fazer, porque ela será tratada como qualquer outro banco ou corretora”.
Para facilitar as coisas para os beneficiários, você pode registrá-los como segundo titular, diz Dilendorf. Mas se preferir não correr o risco da guarda conjunta após a morte, o espólio ainda pode recuperar os fundos através de processos de inventário. Para isso, o seu beneficiário deve fornecer uma certidão de óbito, documentos de inventário e de identificação.
Compartilhar as seed phrases (conjuntos de palavras que dão acesso a carteiras de criptomoedas) é muito mais complicado, disseram especialistas à Fortune. Quanto mais difícil for durante a vida para acessar sua carteira de criptoativos, mais difícil será acessá-la após sua morte. Fazer isso requer um “equilíbrio complicado entre segurança e capacidade de recuperação”, diz Neuman, da Casa.
Park recomenda que essas chaves nunca sejam armazenadas on-line – ou apenas quando é possível aplicar proteções adicionais – e a solução mais fácil pode ser uma das mais antigas: escrever a senha em um pedaço de papel e guardá-la em um cofre ou banco. Alguns detentores de criptomoedas costumam até gravar a combinação em metal para ajudar a garantir sua longevidade.
O que mais é possível fazer?
Para alternativas mais avançadas, considere usar um serviço de e-mail criptografado para enviar informações importantes aos herdeiros após sua morte. Além disso, existem métodos de recuperação por meio de serviços de custódia que permitem que múltiplos herdeiros solicitem coletivamente os dados mediante apresentação de atestado de óbito.
Park diz que uma carteira offline multisig (que requer múltiplas senhas) continua sendo o “padrão ouro”. Além da sua própria chave, pelo menos três chaves exclusivas adicionais são geradas para proteger um conjunto de ativos, e duas delas são necessárias para acessar os ativos. Park recomenda deixar uma para o herdeiro, uma para a empresa que fornece a carteira e outra para o seu advogado. No caso da multisig da Casa, de Neuman, isso não apenas “remove um único ponto de falha”, mas também permite compartilhar automaticamente as chaves com os destinatários de forma criptografada após sua morte.
Caso contrário, pode ser difícil para herdeiros encontrarem o que ficou para trás. Instruções deixadas em papel nem sempre serão suficientes, observou Park.
“Isso raramente funciona bem”, acrescentou. “A maioria das pessoas não mantém as coisas atualizadas. Então, não faz sentido… apenas forneça o nome da empresa onde você configurou sua carteira multisig.”
Na falta de uma carteira com várias senhas, Park disse que você pode sobreviver com uma “versão de pobre”, na qual você adiciona uma senha extra à sua carteira. Dê ao seu advogado o código secundário e, ao herdeiro, a senha principal. Se um dos dois perderem a informação ou forem hackeados, o código de acesso do outro será inútil. “A questão toda”, disse Park, “é dividir a responsabilidade”.
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