É ao redor da mesa da casa dos avós que filhos, irmãos, primos e netos costumam se reunir nas ocasiões especiais, trocando risadas, exaltando os seus sobrenomes e carregando o amor dos patriarcas e matriarcas como bandeira. Por esse e outros motivos, eles têm papel central na formação de laços familiares e construção da personalidade de seus descendentes. Mas, com as dinâmicas familiares em constante transformação, como cultivar essa conexão com os netos, especialmente nos desafiadores anos da adolescência?
A psicóloga Alyssandra Monteiro, especialista em gerontologia do Cora Residencial Senior, explica que a chave está na comunicação aberta, no respeito mútuo e na busca por conhecer melhor os gostos um do outro.
“Comece com a descoberta e entendimento do que a geração Z gosta, intimidando menos, e incentivando trocas de conhecimento. O idoso ensina suas experiências de vida e valores, enquanto a geração Z traz tendências e modernidade”, diz.
Esse tipo de troca pode ser muito positiva para os dois lados. “Os avós transmitem para os filhos e para os netos toda uma herança de como se vive a vida e se encara os problemas”, reflete o psiquiatra Alfredo Cataldo Neto, coordenador do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Saúde Mental (GPESM) do Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUC do Rio Grande do Sul.
Para os vovôs, a geração mais jovem, como a Z, pode ensinar sobre tecnologia e cuidados na era digital, além de promover um convívio que faz muito bem para a saúde mental, segundo Alyssandra.
Para os vovôs, as gerações mais jovens, como a Z, pode ensinar sobre tecnologia e cuidados na era digital, além de promover um convívio que faz muito bem para a saúde mental, segundo Alyssandra.
Mas os benefícios vão além. Um estudo realizado por pesquisadores suíços e alemães acompanhou mais de 500 pessoas com idade acima de 70 anos entre 1990 e 2009. Os resultados revelaram que os avós que cuidavam de seus netos apresentaram uma redução de 37% no risco de mortalidade.
É notável, portanto, que fortalecer esse laço é positivo. Assim, neste Dia dos Avós, os especialistas consultados pelo Estadão dão mais dicas sobre como se conectar com os netos da geração Z. Confira:
Criando laços
Para Alyssandra, um primeiro conselho é descobrir do que os netos gostam, como séries, música, atividades e, inclusive, os seus sonhos. Outro ponto importante é a valorização mútua. Avós e netos devem entender que cada um tem algo a ensinar.
Também, segundo a geriatra e diretora da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) Alessandra Tieppo, é importante ensinar o respeito mútuo.
A médica dá algumas dicas práticas. Segundo ela, fazer atividades físicas juntos pode ser uma excelente forma de se conectar. “Caminhar, andar de bicicleta, nadar. Essas são formas de integração e também de cuidar da saúde. É uma oportunidade para se divertir e criar lembranças vivas tanto para o avô quanto para o neto”, diz.
Imagine aprender a jogar videogame ou fazer vídeos para a rede social TikTok? Essas são algumas atividades que os netos podem proporcionar e que podem ser muito divertidas, além de positivas para estreitar os laços, segundo Alessandra.
Já outro mecanismo de proximidade são as refeições. “Ajudar a preparar a refeição, comerem juntos e contar a história daquele alimento é importante. Compartilhar gostos e preferências culinárias fortalece o vínculo”, diz.
De um modo mais amplo, as especialistas reforçam a importância de valorizar os pequenos gestos, como agradecer e ser solidário, a importância de fazer o adolescente entender que a velhice também é um processo natural da vida e, sempre que necessário, ouvir, discutir, refletir os pontos de vista de cada um.
Já Cataldo Neto aconselha observar os netos adolescentes, buscando entender o que tem acontecido com o jovem, se ele tem se sentido sozinho, como ele está na escola, etc. “Isso aproxima. Quando a gente se sente compreendido, a gente quer voltar a ficar junto com essa pessoa”, conclui o psiquiatra.
Para quem vai começar do zero
O coordenador do Grupo de Pesquisa Envelhecimento e Saúde Mental reforça a importância de os laços virem desde a infância. “Geralmente, avós que se dão muito bem com seus netos adolescentes são aqueles que já têm uma relação muito forte desde a infância”, explica.
Segundo o psiquiatra, se a relação inicial na infância não for muito boa, a conexão pode ser um pouco mais difícil, mas não impossível.
Para esse caminho, Cataldo Neto recomenda uma aproximação afetiva e carinhosa, sem imposição e evitando broncas e correções.
“Eu aconselharia, como muitas vezes faço no meu consultório, uma aproximação compreensiva. Dizer coisas como ‘você deve fazer isso’ ou ‘não pode usar essa saia’ é o papel de pai e mãe. Um avô conquista o seu neto quando ele percebe que, com ele, é compreendido e entendido. É isso que as pessoas buscam nas relações humanas”, resume.
Um laço poderoso
Os especialistas explicam que crianças e adolescentes que convivem com os avós se sentem mais seguros e menos sozinhos. Além disso, os idosos também desviam da solidão e o convívio com os netinhos pode ajudar a liberar neurotransmissores responsáveis pelo bem-estar.
Para os netos, segundo Alfredo, ter a oportunidade de estar com os avós é também como ter uma ‘segunda opinião’ em suas vidas. “Às vezes, a relação entre um adolescente e seus pais pode ser carregada de conflitos, e uma terceira pessoa nessa relação pode ajudar muito”, diz.
Do ponto de vista dos avós, é uma grande chance de fazer de novo. O psiquiatra reflete: “Quem tem a oportunidade de ter um neto rejuvenesce, pois pode fazer de novo. Quem de nós não gostaria de retornar um pouco ao passado e fazer as coisas de modo diferente? O avô e a avó podem corrigir o que perceberam que poderiam ter feito diferente com os filhos”.
Por outro lado, alguns estudos mostram que a criança que mantém um relacionamento positivo com seus avós tem uma autoestima mais elevada, tem mais facilidade em desenvolver habilidades sociais e comportamentais, conforme completa Alessandra.